sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Nojo de vômito

Estou cansado de brigar sempre pelo mesmo assunto, pelo mesmo problema que jogam em minhas mãos como a brincadeira "batata-quente".

Em dois dias passei por situações semelhantes em dois eventos diferentes. Ontem fui convidado a participar de um colóquio sobre acessibilidade promovido pela Secretaria de Educação da cidade, chegando lá não pude subir ao palco porque os arquitetos não acreditam que pessoas com deficiência têm o que falar e os organizadores dos eventos não têm o devido respeito aos seus convidados e não providenciam meios de acessibilidade para facilitar suas vidas, acreditam que o velho jeitinho de arranjos é uma boa saída.

Me recusei a subir ao palco carregado e comecei me fala junto a platéia. Lógico que reclamei da falta de respeito e de forma sutil disse que todo o discurso de acessibilidade que se pretendia ali seria nulo, porque eles não cumpriam o que pretendiam num detalhe que faria toda diferença.

Hoje foi a conclusão do workshop de poesia falada que Elisa Lucinda ministrou esta semana na Faculdade 2 Julho e onde eu melhorei meus dias desde segunda-feira. Elisa faria uma palestra numa conferência sobre Direitos Humanos e seus alunos encerrariam sua fala recitando poemas de autores diversos.

Cheguei sabendo que já teria um problema pela frente que era a escada que levava ao auditório. O que eu não esperava era a falta de respeito e de preparo das pessoas que a frente da tal conferência. Para começar mandaram eu esperar embaixo, enquanto eu esperava chegou uma feladaputa dizendo para eu assistir no telão posto no refeitório, outra me perguntou se eu precisava de ajuda para subir e eu só cruzei os braços e olhei fixamente nos olhos, depois dois senhores me carregaram na cadeira de rodas e chegando ao topo da escada um me falou "tá vendo? já chegou!" como se tivesse sido a coisa mais natural e fácil do mundo, para completar outro coleguinha concluiu a noite: "pronto, o problema acabou!".

Não! Não, meu senhor! O problema acabava de começar! Com sangue na garganta e olhos marejados de tristeza e raiva eu tive que ouvir justificativas infundadas e explicações ridículas das pessoas daquela instituição. Pensei em desistir de falar meu poema, sair, me recusar a compactuar com aquilo, mas não, falei meu poema lindo de Drummond e ao término desrespeitei o protocolo, interrompi o coito e bradei:

Acessibilidade também é assunto de Direitos Humanos!

e gosto de dar nome aos bois para se envergonharem. A impressão que tenho é que as pessoas vomitam o belo discurso sem saber do que estão falando, sem compreenderem do que se trata realmente, acusando o outro, a sociedade. Não percebem que somos nós que fazemos a merda toda.

Eu morro de nojo de vômito.

15 comentários:

Cléa disse...

Você me orgulha meu amor!!!
Acho que meu post sobre a estupidez humana foi em homenagem a esse pessoal aí... Oportuno e mais uma certeza de que estamos irremediavelmente conectados.
Todo meu amor...

Unknown disse...

Mostrar a bunda, falar palavrão, trepar com quem quiser, dá o cu isso não é imoral. Imoralidade é ser cidadão e nem ao menos poder circular nos locais,porque deficiente tem que ficar trancado em casa. Sei como se sente, me sinto igual, porque esse "jeitinho" é vergonhoso...

Muadiê Maria disse...

Querido Eduardo, estamos engatinhando em direitos humanos, estamos longe, estamos fracos....
A vida não é fácil, garoto, mas temos pessoas como você, que sabem ler Drummond.
Um beijo bem grande

O Neto do Herculano disse...

Pois é camarada, no discurso tudo é fácil, bonito. Poderia dizer que imagino o que passa e o que passou, mas sei que não é tão simples assim.

- Luli Facciolla - disse...

Com licensa para a expressão:

Bote pra fuder, Edu!

Todo o meu apoio!!!

Beijos

PS: Também tenho saudade das visitas!

Anônimo disse...

Concordo com Martha. O pouco que se faz para mudar essa mentalidade é por força de lei civil e não de lei moral. A iniciativa privada, leia-se nossas empresas, deveria dar o exemplo. Mas sou testemunha de que falam mais alto os custos de modificação de estruturas físicas e o discurso da acessibilidade e da empregabilidade de cadeirantes se perde no manual nada prático de responsabilidade social.
Com porradas verbais como esse seu texto, vamos acordar um dia. Eu inclusive.

Moniz Fiappo disse...

Mais uma prova da estupidez dos gestores de tais eventos.
O pior é que nada muda. O melhor é que há pessoas como voce!

Gerana Damulakis disse...

"O melhor é que há pessoas como você". Esta frase linda de I. Moniz Pacheco me arrepiou e diz tudo. Acredite sempre na sua força, ela chega até nós todos, que acompanhamos seu blog.

karina rabinovitz disse...

quebrar o protocolo com este grito, depois de ler drummond, faz parte da sua poesia! você poesia.

Bernardo Guimarães disse...

sempre fico envergonhado como se fosso minha culpa - e é!- esses desrespeitos em cada esquina.é minha porque a gente só se indigna quando um deficiente brada do outro lado. desculpe.

Di disse...

E eu nem lembrei das minhas recomendações com a voz e GRITEI, E LEVANTEI... e também me orgulho muito de você e fiquei feliz de estar presente.
Te amo!

AMSacco disse...

Eu já tinha ouvido essa história, mas quando contas o tapa na cara é ainda mais ardido. Tua escrita é belíssima, mesmo em meio ao vômito.
Ah, tu não me conheces, mas eu ouço tanto falar de ti que já és quase um amigo de infância. Morro de vontade de conhecer a Judite! :)
Beijo da Branca

Cléa disse...

Ô... esqueci de apresentá-los: Branca... Edu, Edu... Branca! rsrsrs

Andréia M. G. disse...

A dificuldade de acessibilidade é um problema que infelizmente ainda não é levado a sério. Deve ser mesmo uma merda vivenciar tais situações. Apoiadíssimo! Estamos realmente muito verdes no que diz respeito a direitos humanos e me incluo nisso tb, porque acredito que, de alguma forma, cada um tem sua parcela de culpa, por ação, omissão, inércia ou que mais possa ser.

Marcus Gusmão disse...

Você deu sentido a um colóquio que seria de palavras vãs.