quarta-feira, 28 de novembro de 2007

Queixa contra o PROCON

Eu gostaria de escrever sobre minhas alegrias e conquistas. Eu adoraria dividir minha satisfação e sucesso. Eu amaria falar sobre o sucesso de Judite na França e Argentina, mas, infelizmente, chegando a Salvador eu me deparei com a tristeza e a indignação, me defrontei com o descaso e a discriminação, e é sobre isso que terei que falar.

Depois de quase um mês de sufoco com ao Provedor Oi Velox, resolvi reclamar por meus direitos de consumidor e procurei o PROCON no SAC do Shopping Barra. Chegando lá, dirigi-me ao balcão de informações e relatei meu caso a um dos funcionários, que tentou ajudar-me. Dirigiu-se ao PROCON que fica localizado num andar acima do térreo e como sou cadeirante e não havendo elevador ou rampa de acesso, não pude chegar ao órgão que procurava, então, este funcionário do SAC procurou ajuda para me levar ao andar superior e não teve sucesso na busca por alguém me ajudasse a subir, então foi procurar um funcionário do PROCON para que me atendesse embaixo, quando voltou fui informado que os funcionários do PROCON se recusaram a descer e que me encaminhavam para o Juizado de Pequenas Causas que ficava no andar térreo do SAC. Fui obrigado a entrar com uma ação judicial contra o Provedor podendo resolver as coisa de forma mais administrativa, por conta do despreparo dos funcionários de um órgão que está à disposição de todos os cidadãos.

Eu pergunto: por ser deficiente físico eu não tenho direito aos serviços que toda e qualquer pessoa tem à sua disponibilidade? Não há uma lei, inclusive, que nos dá prioridade nos atendimentos?

O pior de tudo é que, como eu fiquei abalado emocional e psiquicamente, busquei auxílio na ABADEF (Associação Baiana dos Deficientes Físicos) na pessoa da presidente Maria Luíza Câmara, para quem telefonei no momento do ocorrido e que imediatamente entrou em contato com os responsáveis pelo caso. Quando saí do juizado estavam os funcionários do SAC e do PROCON querendo saber o que tinha acontecido e me tratando como um incapaz ou um imbecil, falando coisas sem nexo como, por exemplo: “nós também sofremos “descriminalização” porque fomos colocados num canto escondido” ou “não tem problema, não, pedimos desculpas e vamos tentar resolver”. Não tem problema não? O problema já existiu desde que entrei no SAC, porque minha auto-estima foi ao chão, minha autonomia foi descartada, minha possibilidade de independência foi ignorada. “Descriminalização”, minha senhora? Quem sofreu discriminação fui eu. Quem viveu constrangimento fui eu. Vocês jamais poderão saber o que é ser tolhido de resolver, sozinho, suas próprias coisas por causa de uma deficiência, vocês jamais saberão o que é depender e precisar ter sempre alguém do seu lado para te defender de mentalidades como as suas. Eu sou capaz de fazer tudo, eu sou capaz de viver independente, mas para isso é necessário que vocês permitam, é imprescindível que vocês tenham o mínimo de inteligência e sensibilidade, porque esta briga não é só minha. Quando vocês me impedem de realizar qualquer coisa e me tratam como um incapaz, estão enfraquecendo e desvalorizando todas as pessoas que têm algum tipo de deficiência. Quando vocês me infantilizam, estão tentando não só a mim, mas excluir e impossibilitar de viver dignamente todos os adultos e cidadãos que assim como eu andam em cadeiras de rodas, de muletas, não enxergam ou escutam ou têm qualquer outro tipo de problema físico ou mental.

Não preciso de sua piedade, eu exijo seu respeito!

terça-feira, 27 de novembro de 2007

Ir



Não quero comida
Nem quero trabalho
Escravo
Sacrifício no fim do mês?
Não quero você
Nem mais ninguém
Gosto do meu cheiro
Meu riso
Eu gosto de mim
Urgência para mim é cara feia
É a fome
E eu tenho muita sede
Urge em mim a sede de liberdade
Nada de amarras
IR
Eternamente IR
E rir de mim
Sem ponto de chegada
IR sem destino
Seguindo meu destino
Sorrindo
Urgentemente IR
Urgência pra mim é dormIR

Foto: Clarice Miranda

Judite quer chorar, mas não consegue!

Esse vento é um vento de choro
Vai cair a maior lágrima.
Xiii, ela está na janela!!!
Não é nada bom isso
Quando vocês virem Judite demorando na janela, não critiquem
É sinal de que não está nada bem
Não é que ela esteja tomando nota, querendo fofoca
Quando ela sai da almofadinha e fica na janela é como se ela estivesse fora
É o momento de Judite no mundo
Fica vendo a vida, o tempo, as pessoas passarem...
Respeitem a dor
Ela quer chorar, mas não consegue!
Tadinha de Judite!!
A vida não foi tão amiga para ela
Desde pequena sofre perdas
Sofre danos
Mas ela vivia sorrindo, falseando uma alegria que não tinha
Hoje vive a tomar chá de frutas vermelhas, encostada numa almofadinha olhando para o nada, se envenenando com coisas que assiste
Outro dia teve um sonho
Acho que foi o único da vida de Judite
Sonhou que conseguia voar e que brincava com as pipas pelo céu.
(falando o errado francês de Judite) “Je voudrais de l’eau, se te plais”
Passa o tempo inventando seu francês e cantarolando músicas
È até engraçado ver Judite cantar
Ela fica toda vermelha de vergonha
Vez em quando levanta, suspira, olha para um lado, olha para um outro lado
E está só
é, Judite é sozinha
O marido quis voar e vive agora num canto mais florido
Dos filhos que teve um virou borboleta
E um outro vive a ambigüidade de permanecer rastejando ou partir em vôos mais altos.
Judite tem medo de tudo
Não consegue sair, se divertir, trabalhar...
Judite não consegue nada
É um tal de lava mão, lava pé, lava cara
Toma chá, come chocolate, lava xícara...
Arrete, Judite!
Ela não teve escolhas
As coisas foram acontecendo
Dizem que é o tal do destino
Ela, por sua vez, não lutou para mudar isso
Judite cansou das rosas...

Ahh! Esqueci de dizer que Judite é a lagarta que morava na comigo-ninguém-pode lá de casa

Até hoje não se tem notícias de Judite
Ouvi dizer que tinha alguém parecido com ela
Vestindo a mesma roupa, mesmo chapéu, mesmos gostos
Que sai por aí contando a vida da coitada
Às vezes penso que pode ser a própria Judite disfarçada, mas...
Eu queria mesmo era saber como ela está

Sobre Aguarrás

Aguarrás foi o início de tudo. Lembro que fazia faculdade de Belas Artes e amando muito uma pessoa que não me amava nem me amaria como eu gostaria que acontecesse, me sentindo muito só, aquela solidão de quem nunca tinha sido amado, entende? Este texto me veio completo, de uma só vez, me dilacerando, me doendo e eu expurgando. Daí peguei uma matéria na Escola de Teatro e apresentei para a atriz Renata Celidônio para ela ver se era bom. Eu não havia escrito Aguarrás pensando em nada, era somente para tirar aquilo de dentro de mim, mas o fim dessa história foi minha primeira aparição num palco, dirigido por Nei Wendel, em 1998, num ATO de 4 (projeto incrível que ainda existe toda segunda-feira na Sala 5) . De lá para cá escrevi muitas coisas, algumas viraram Monólogos na Madrugada (criação minha com meu irmão/amigo Zunk Ramos e encenado, além de nós, por maravilhas como Cristiana Ferreira, Fabrício Boliveira, Marita Ventura, Larissa, Patrícia Rammos, Chico Pithon, Sebah, participação de Fafá Daltro, Marcela Bellas, Júnior e Márcia Castro), outras Estação Limite (Zunk também e uma trupe do Rio), outra Sem Açúcar (direção: Maurício Pedrosa comigo, Maurício, Gilson Garcia e Emanoel Nogueira)...
Aguarrás foi o início de tudo! De lá pra cá subi em inúmeros palcos baianos, cariocas, paulistas, mineiros, paraibanos e até franceses e portugueses. De lá pra cá construi uma carreira que tem me dado muita alegria. As artes plásticas perderam um artista medíocre, mas a dança ganhou um artista empenhado.
Não tenho escrito como antes. Não tenho tido tantas tristezas para expurgar. A última foi Judite, meu xodó, minha filha, meu maior sucesso e orgulho. Judite a tal da lagarta que não quer voar porque tem medo de tudo, me fez voar mais alto do que pensei. A lagarta que vive na trsiteza me deu grandes alegrias.
Aguarrás foi o início de tudo!!!!!!!

Aguarrás

Alô! É do 102?
Eu gostaria de saber uma coisa:
Você viu meu amor? Onde ele está?
Ah! Vocês não dão esse tipo de informação!
É que eu pensei que o serviço de informações fosse para qualquer coisa.
Então tá! Desculpe!
Mas olhe, é que eu estou tão só! E não sei para onde ele foi.
Acho até que nem vai voltar!!
Me responda só isso: você acha que ele volta? O que é que eu faço, hein?
Eu estou te atrapalhando, né? Desculpe de novo, tá? Tchau!!
Simpática! Grossa!
Cavala! Estúpida!
Se não sabe trabalhar pede demissão minha filha!
O que é que é isso! É brincadeira, né?
Não sabe dizer onde uma pessoa está!
É uma questão básica!
Pelo amor de Deus! Nem que a cidade fosse gigantesca!
É não é tão pequena assim!
Mas bem que ela poderia me dizer pelo menos isso,
Não ia custar nada!
É porque ela não sabe o que é estar só!
Eu não aguento mais olhar para a cara desse relógio, dessa porta, muito menos para a cara dessa televisão!
É sempre assim: relógioportatelevisãorelógioportatelevisãorelógioportatelevisão
É uma rotina chata!
Eu até tentei diversificar um pouco fazendo bolinhas de meleca, mas não agradou muito
E no mais acabaram logo.
Estou sem saber o que fazer
Alguém com certeza diria: “Vai pegar um livro para ler!”
E eu com toda paciência do mundo iria responder: “Se fosse para ouvir era rádio!!”
Oh! Porque livro para ler é óbvio, tanto quanto ler alguma coisa nesse meu estado fica difícil.
Não consigo assimilar nada!
Tentei desenhar, pintar, fazer alguma coisa assim,
Mas só saía o rosto de meu amor e ainda por cima deformado!
Nunca consegui atingir aquele tom dos olhos,
A curvinha que ele faz na boca,
As sobrancelhas,
O sorriso!
Então joguei tudo fora!
Eu até coloquei nossa música no repeat.
(Ah! Cazuza, você sempre meu cúmplice!)
E cantei o dia todo: “Quando a gente conversa... Nessa novela eu não quero ser o seu amigo... Eu preciso dizer que te amo...”
Eu cantava como uma forma de oração,
Eu cantava rezando, pedindo que ele chegasse,
Que ele voltasse para mim.
Logo eu que esqueci como se reza, pedi a Deus que trouxesse meu amor.
Mas acho que Ele se esqueceu da minha voz,
Ou então está muito ocupado e não vai perder tempo com um descrente como eu.
Não me enxerga, não quer me ouvir!
Se eu conseguisse dormir!
Mas acabei todos os calmantes!
Já sei! Acho que vou lavar os pratos!
A gente sempre reflete lavando pratos,
Fica ali parado, mexendo com água,
A água acalma, é o que dizem!
No mais posso pensar em alguma coisa legal para fazer enquanto estou na pia...

.................................


Você chegou!
Graças a Deus!
Eu já lavei os pratos estava esperando você chegar para enxugar.
Não, enxugar os pratos não!
Enxugar minhas lágrimas.
Foi. Eu estava chorando.
Ah! Não sei por quê!
Hein! Ah! Pára de tanta pergunta!
É que eu estava com medo.
Ah! Não sei! Medo de que! Medo de que?
A gente está tão bem, né?
É que por uns momentos eu achei que você poderia não voltar.
Eu olhei para tuas coisas: tua cadeira, tuas gavetas, teu copo...
Vi tudo tão vazio...
É, devem ter sido as lágrimas, elas sempre confundem.
Mas eu fiquei com muito medo.
E se você cansou da minha voz!
Se minha comida, meu sorriso não mais te agradam!
Se nossa cama ficou pequena demais e só me resta o chão!
Não, não é paranóia, não!
Acontece, isso pode acontecer,
Se nós que nos julgamos eternos acabamos, quanto mais o amor,
Ele é muito vulnerável e impaciente.
Se você encontrou outra pessoa na rua,
Se seus olhares se cruzaram,
Você pode muito bem ter se apaixonado por ela.
Ah! Eu não quero nem pensar!
Está vendo! Aconteceu alguma coisa, sim!
Você nem me beijou!
Esse beijo eu não quero,
Esse beijo não vale!
Eu beijava minha mãe assim!
Eu quero é língua com língua
Língua com pêlos
Língua com sexo
Por falar nisso, ele saiu e nunca mais voltou.
Ele, o sexo! Eu nunca mais o vi aqui em casa.
Ah! Pára meu amor! AAII!!! Pára!
No cangote você sabe que eu morro!
Páraaa! AAII!! UUII!!
PáraaAAII! Esse maldito telefone!
Alô! Oi mãe é engano!
Não mãe, sou eu mesmo, mas a senhora ligou errado!
O que? Oh! Mãe desculpe!
Parabéns! Não precisa chorar, né mãe?
Eu nunca esqueci teu aniversário! Desculpe!
Eu sei que a senhora só tem a mim, mas é que eu também
Só tenho a mim!
Olha, eu estava indo fazer um jantar
Esperando uma pessoa
Venha jantar comigo.
Não, a senhora não vai atrapalhar!
É que eu estava esperando por alguém que nunca vai aparecer.
Então a gente comemora teu aniversário
Com jantar a luz de vela, vinho, sobremesa
Vem logo, não demora!
Um beijo!
TCHAU!

É enlouquecedor passar a vida sem ter sido amado
!!