quinta-feira, 19 de junho de 2008

Dona de toda beleza

Flores de papel crepom,

flores vivas

flores lindas


flores do meu amor

Foto de Edu O.




O trabalho da artesã (MARAVILHOSA) Dinorah Oliveira é uma das coisas mais belas que conheço em artesanato. Sua dedicação, seu acabamento, seu incontestável bom gosto... Eita coisa feia um filho elogiar tanto a mãe, né? Né não!!! Se todos fossem filhos de Dinorah. Se todos convivessem com a religiosidade com que Dinorah produz. Manhã, tarde, madrugada.... A vida produzindo. A vida nos colorindo.

foto de Carla Guedes dos oratórios em caixa de fósforo


Dinorah é daquelas raras pessoas que podem se orgulhar de FAZER o seu ofício. Deita tranquila, nem tão tranquila, sabendo que fez mais uma das belezuras do mundo.

O passado de novo

Todas as noites ele chegava
Como quem assiste a um espetáculo pela primeira vez
Olhos curiosos, procurando, bulindo, vasculhando,
Descobrindo em cada canto da casa alguma novidade
A mesma casa que conhecera há tempos atrás
Mas havia sempre um detalhe, um objeto,
Uma surpresa descoberta:
Um incenso, uma flor num jarro novo,
Uma nova xícara para o mesmo conhaque com café
Para um gosto novo na boca que era nossa.
Olhava meu corpo com olhar de paquera
E descobria sempre um ponto, um sinal, uma espinha chata
Que mancharia aquele corpo que ele dizia: “Meu”
Aqueles dedos percorrendo meu arrepio,
Aqueles lábios tocando meu desejo,
Aquele homem protegendo meu corpo...
Os mesmos dedos, mesmos lábios, mesmo homem
Em novos arrepios, novo desejo,
Meu corpo novo, embora mais marcado, cansado
E mesmo assim mais feliz.
Eu, do meu lado, o via entrando,
De imediato disparava uma campanhia,
Uma locomotiva em mim
Como se nunca o tivesse visto.
Tínhamos o mesmo anel artesanal
Comprado num hippie camelô de uma cidade do interior:
Coração de Maria.
Eu tinha a impressão que era meu coração que estava exposto como na imagem
Meu coração o adorava como a um santo
Nos conhecemos assim,
Numa coincidência dessas de final de tarde, de pôr-do-sol
A minha mão esquerda de despedida
Tocando a sua mão direita de intruso
Pegando o mesmo anel escolhido
Dois sorrisos, dois olhares,
Uma só gentileza
“Pode ficar!”
E´ que eu já havia pagado pelo anel
Mas a indecisão que me acompanha
Atrasou a minha compra
No jogo de empurra
O artesão resolveu produzir outra peça idêntica
Nesse momento eu já sabia
Que ele era de Sagitário com ascendente em Virgem
Eu já tinha 29 anos, beirando os 30
E sou de Áries sem ascendente
Conversamos horas sobre gostos, musica, profissão,
Hotel, passagem, ida...
Eu que tinha ido visitar um parente
E já estava de saída,
Permaneci mais dois dias
Sob os olhares indiscretos daquela gente.
No ônibus de volta
Falamos de impulso, loucura, casamento
E de como os apaixonados se renovam a cada novo desejo
A nossa paixão nos mantinha
Numa novidade a cada instante
Nada, mesmo que repetido, era igual
O seu gosto por mais conhecido que fosse
Para mim era novo
O rosto, os pelos, os cabelos,
O sorriso, a voz, a canção,
O andar, o abraço, o amor, a mão...
Tudo fazia parte de um mesmo contexto antigo
Mas que era atual
Ou atualizado a cada chegada de um novo dia
A cada ritual novo de um novo banho,
De um novo jantar, de um novo beijo...
Ele chegava manso,
Morno,
Amoroso,
Viril,
Gostoso,
Naquele velho gosto de conhaque com café
O sono tranqüilo como nunca havia dormido um dia
Sem a insegurança do ciúme pelo sonho,
Pela camisa amarrotada,
Pelo telefone no bolso da calça...
Tudo era meu
Tudo era eu
A despedida nunca foi martírio, forca, guilhotina
Era um intervalo da sessão da tarde,
Cada um para um escritório
De vez em quando para a cervejinha do final da tarde
E o retorno sempre confirmado
Era então que o dia se completava
E a rotina virava amiga primeira
Madrinha de casamento
Mas teve uma noite que ele não veio
Duas noites sem retorno
Três, quatro...
Aquela infinitude de minutos sem ele
Era o final da ampulheta dos meus dias
E aquela novidade realmente nova
Maldita, sem graça, sem porque
Fez da minha sessão da tarde
Um corujão da madrugada
Lambia a ultima gota da xícara
Como quem chupa uns seios, um pênis, uma vagina
Eu me sentia uma menina
Com ímpeto de quebrar a xícara
Como quem rasga calças, cuecas, vestidos
Tomando leite no pires
Como quem beija uma boca
Tão louca, desnorteada,
Sem bússola,
Caminhando para um sul
Que eu não sabia para onde me levaria
O telefone veio pelo fio
Espatifado nos pés do porteiro no playground
Os incensos, o jarro, a xícara,
A revista, o porta-retrato, cadeira e mesa
Tudo espalhado
Aos pés de uma pessoa insana
Que já não sabia o que fazer
Com a dor que insistia em acordar
A cada dia novo
Como se fosse o passado

PS 1> Já que estamos falando tanto em passado...

PS 2> Texto meu interpretado por Fabrício Boliveira na apresentação de Monólogos na Madrugada no Café Zélia Gatai e no Quixabeira - 2003

O passado sem disfarces

Olho pro céu!
Meu avô!
Vejo como ele está lindo!
Sorrindo do meu choro alegre.
Do meu sentimento entregue
De ver a vida brotando!
De ver a felicidade palpável
Nos olhos da minha mãe,
Da nova mãe, minha irmã!
Foi nesta noite sem igual
Que eu entreguei o meu coração
De presente ao passado,
Em casamento com o futuro!

Na roça, na Rocinha,
Uma Paloma da paz
Voava ao redor dos sonhos
Que eram de todos
Sem que pertencessem a ninguém!
E era tanta gente
Que os sonhos cresciam
Nos olhos, nos copos,
Nas damas de copas,
Nos risos de ouro!
Nas asas do anjo
Com penas de pomba!

O céu estava todinho em festa!
A Terra estava todinha em festa!
Era uma noite de São João
Na Rua Direita, na Rua do Amparo,
Nas ruas que amparam sonhos
Em forma de música,
Em forma de foto,
Em forma de sonhos.
Era noite de Nossa Senhora,
De uma nova senhora,
De um novo trio de nordestinos!
Noite de sonhos e destinos!

Acordei hoje dessa viagem linda!
Dessa viagem de tanta felicidade,
Com gosto gostoso do licor
E de comidas tantas...
Comidas do corpo...
Alimentos da alma...
Sonhos da minha infância de ontem,
Sonhos da minha infância de hoje,
Sonhos da minha infância de sempre...
Hoje acordei dessa viagem linda...
Dessa viagem de tanta felicidade
Que acordei sem deixar de sonhar!

Marquinhos Valadares

(Para Edu O., como agradecimento pelo seu texto!)

PS> O que dizer despois disso? Obrigado é muito pouco. Assim como agradecer aos comentários tão amorosos sobre meu texto. Isso é amor!


O disfarce do passado

Olha pro céu, meu amor
Vê como ele está lindo!!!

Chorei ouvindo essa música na saída do casamento de minha irmã. Chorei ao ver tantos amigos, tanto carinho... Chorei lembrando de meu sobrinho que vem vindo, de meu avô que já foi. Chorei pela alegria gritante de minha mãe que nunca mais tinha demonstrado tanta alegria, dançando até 4 horas da manhã, rindo, feliz. FELIZ!!!! Era por isso que eu chorava... porque quero ver minha irmã feliz com sua família, quero minha mãe feliz, eu quero ser feliz.

Foi numa noite igual a esta
Que tu me deste o teu coração

A cerimônia do casamento (casamento na roça de mentira, que mais era de verdade) na praça da Rocinha, lugar lindo, interior no interior de Sto Amaro, foi a mais bela que já vi. Os noivos LINDOS como se espera de um casamento, minha irmã nervosa pelas ruas de Sto Amaro como quem entra deslumbrante pela Purificação. O noivo nervoso bebia pelo enlace matrimonial. A avó do noivo dourada de contentamento. O Pai da noiva, que era um tio, tio Jorge e seu celular ultra-mega-moderno. Minha mãe (linda) e a mãe do noivo, o pai do noivo, o Padre Aldinho com a sacristã Makiba, os guardas-de-honra Coeli e Kikiki, o anjo Ed, Paula mulher traída com sua filha Cléa, os padrinhos que foram tantos que prefiro não enumerar para não cometer a indelicadeza de esquecer algum e tantos convidados, tantos olhos brilhando, tantos sorrisos, tantas cantigas bonitas, assustando a noiva quando viu de cima a quantidade de gente que seguia seu cortejo.
O céu estava
todinho em festa
pois era noite de São João
Circulamos parte da Rua Direita, passando pela Rua do Amparo para receber a benção de meu avô (aquele do início da estória). E teve homenagem da cantora-amiga que se apresentava no palco e teve foto no adro da igreja para Nossa Senhora abençoar e teve trio nordestino acompanhando esse furdunço todo até o fim da festa.
Cheguei hoje dessa viagem linda, dessa viagem de tanta felicidade, com gosto gostoso do licor e das comidas muitas que nos fartaram e me trouxeram gostos de minha infância, de minha avó Zinha, de meu passado delicioso que permanece assim disfarçado de presente.
Não é nem madrugada ainda e eu já estou aqui.

domingo, 8 de junho de 2008

quinta-feira, 5 de junho de 2008

Viva São João!!!!

detalhe de estandarte de São João produzido por Dinorah Oliveira

PEDRO, ANTÔNIO E JOÃO
autor: Benedito Lacerda e Oswaldo Santiago

Com a filha de João
Antônio ia se casar,
mas Pedro fugiu com a noiva
na hora de ir pro altar.

A fogueira está queimando,
o balão está subindo,
Antônio estava chorando
e Pedro estava fugindo.

E no fim dessa história,
ao apagar-se a fogueira,
João consolava Antônio,
que caiu na bebedeira.


PS: Confesso que na infância São João não era minha festa preferida, mas ultimamente, talvez por não ter estado muito nos festejos juninos por causa de viagens, tenho sentido uma alegria "fogueirando" meu coração quando se aproxima a época dessa festança gostosa. Gostosa mesmo, com tantos sabores, licores, amores de casamento na Roça, viveres....
Adoro essa música e tantas outras. Queria que a fogueira de São João clareasse as idéias de meu povo e como num pipocar de bombas o bem se fizesse vencer, assim como a lucidez da generosidade e respeito, a alegria de dançar a vida inteira com os irmãos.

Esperando Godot


“Então, devemos partir?”, ao que Estragon responde, “sim, vamos”.

Mas eles não se movem.


PS>Só estou esperando Godot.....

Dia dos Namorados

"é enlouquecedor passar a vida sem ter sido amado"
já me dizia Aguarrás
há 10 anos atrás.
Que bom que hoje estou curado.

PS- há 3 dias dos namorados eu tenho alguém especial. O engraçado é que nunca pudemos estar juntos nessa data, embora estejamos dentro.

Terceira pessoa

Ele sempre esquecia que homem tembém gostava de mulher.
Gosta, né?
Tinham coisas óbvias que ele não se dava conta.
Tipo: ter que pagar conta no vencimento.
ter, ter... não tem, mas que é melhor, isso é.
Eu sempre dizia, mas ele esquecia.
Limpar tênis.
Principalmente o All Star.
Dormir cedo.
Comer folha.
Prato colorido nunca. Tudo é bege, no máximo amarelo.
Tem uma corrente desses natularistas que diz que o ideal é comer um prato colorido.
Isso é saudável. Ele sempre esquecia de ser saudável.
Mas ele ria.
RIA.

terça-feira, 3 de junho de 2008

Extremos

Pela segunda vez sinto-me grávida, talvez porque só agora aceito a realidade de estar só e precisando de companhia. Então estou grávida de solidão. O mais incrível é que há exatamente nove meses que transei e agora que seria a hora de expulsar o feto é justamente o tempo que o fecundei. Estranho... Não sou fêmea. O macho que me habita foi quem me fecundou e no tempo da expulsão, do nascimento, germinou em mim um fruto de não sei o quê. A indiferença de quem seria o pai. Do que estou grávida enfim? Solidão, indiferença? Sabe-se lá sobre gravidez de macho... Sabe-se lá sobre mim...

Queria falar-lhe sobre a dor, queria falar-lhe sobre como o vidro na areia feriu meu pé que não pisa e tirou-me o foco do mar. Nunca mais vi o mar. Nunca mais vi ninguém que me pusesse o mar. Retorno-me ao meu sonho de infância em que uma gigantesca onda parece desabar sobre mim que estagnado espero passivo a morte, mas não morria, ao contrário, acordava assustado, chorando. Nascia? Nunca saberei, já que a realidade é o que me afoga e parece matar-me.

Preciso descobrir em mim o limite dos extremos. Como agora que leio algo ruim sobre a cidade onde conheci o belo, vivi o sonho e que depois de passado o tempo de fecundação me relembra o que não vivi e sinto náuseas. Passei esse tempo vivendo a mentira como se fosse uma infinita verdade. Eu, no fundo, vivi o que passei, mas é que o sentimento tomou proporções imensas tornando-se maior do que a realidade, assim o passado transformou-se numa mentira, a partir do exagero das sensações que se acumularam como os dias nos calendários.

Só consigo viver os extremos. Não há um equilíbrio na minha fala, no meu pensamento. Até que ponto a normalidade me habita? Todas as horas dos dias faço um enorme esforço para manter a lucidez, não enlouquecer, mas como saber se isso já não ocorreu? Os loucos não têm consciência da sua insanidade. Essa constatação me amedronta ainda mais, pois se a loucura já me penetrou os outros não perceberam. Vivo afundado em loucura...


Meu Deus mostra-me o limiar das coisas! Eu sempre descri na infinita bondade de Deus, como agora posso solicitar compaixão? Se Deus é o que penso, meu Deus então é um louco e não poderá me ajudar nessa questão.

Está difícil concluir.

Meu filho sussurrou no meu ventre, nesse instante, um nome inaudível. Inconscientemente sei que conheço esse filho, esse pai e mais do que nunca preciso trazê-los à tona. A gravidez desse momento trouxe-me a tontura, acho que vou parir pela boca: vomitar, gritar, sei lá... Abortar antes que o germe (germe vem de germinar?) cresça em mim. Ao abortá-lo também morrerei. Ele é minha história, o reconheci num sonho que acabei de ter acordado.