Acredito que em todo interior pequeno é assim, pelo menos em Sto Amaro é, muitas pessoas são chamadas pelo nome seguido do nome da mãe ou do pai: Gabriela de Lurdinha, Carla de Dó, Edu de Dinorah, Rodrigo de Dona Canô, Eduardo de Norminha, Carol de Herol, Carol de Consuelo, Flavia de Célia, Katinha de Leda, Patricia de Genebaldo, mas a que eu vou falar hoje é a Patricia de Dona Detinha. Ela não sabe a importância que tem na minha vida. Certeza que não. Deve achar que só é lembrada por causa das loucuras, também, mas não só. Tenho histórias incríveis vividas com esta amiga. Lógico que no momento não temos a dimensão do que acontece em nós, mas muitas coisas me transformaram.
Eu não me dava conta de quantas vezes eu já tinha falado sobre uma tal pipa. Em Judite, em Odete, no blog... sempre citei o nome dela, mas nunca contei a história propriamente. É um caso mais vivido na imaginação e talvez nem ela se lembre, porque de fato a nossa pipa nunca voou. Não passou de tentativas frustradas. Ela é apenas dois anos mais velha do que eu e eu devia ser pesado para ela me carregar, mesmo assim ela me colocou nos braços, pegou a linha da pipa e saiu correndo. Nós não sabíamos empinar aquele negócio, não soltávamos a linha, não puxávamos, apenas corríamos. E eu que nunca corri na vida, na senti o vento e as casas apressadas passando por mim. Eu ria alto e pouco me importava se aquela pipa não saía do chão, o fato era que eu, pela primeira vez EU estava voando nos braços daquela menina. Muitas coisas foram a primeira vez com ela. Os beijos de lingua embaixo da mesa. A primeira pessoa a dizer que estava apaixonada por mim. as corridas de bicicleta...
No tempo em que ela confessava sua paixão, eu não estava preparado para aquilo. Eu não tinha idade, eu não sabia, eu tinha vergonha de ser amado. Eu não sabia amar. Os beijos aprendi a dar e gostava, embora também ficasse tímido se alguém soubesse. E a bicicleta...
A galera da rua se juntava para fazer passeio de bicicleta. Lógico que eu não podia jamais andar nisso, mas com Patricia era possível. Me enfiava na garupa do negócio, minha mãe enchia de recomendações que ela obedecia até virar a curva da rua. Ia mansa, devagar, depois saía desembestada atrás dos meninos que iam lá frante numa disparada só. Nós os alcançávamos e atravessávamos aquele bairro inteiro: Rua K, Rua D, Rua A, quando chegava na Rua B, o calçamento ainda não estava completo, havia um pedaço de chão de barro, às vezes fazia lama com a chuva e num determinado ponto, era o ápice da aventura, todas as biciletas eram escarreiradas por um cachorro enorme. Eu gritava e Patricia fazia questão de passar bem juntinho, afrontando o bicho. Eu chegava em casa exausto e dolorido com os tombos daqueles paralelepípedos que faziam a bike voar.
Mainha era incrível, ainda é, mas naquele período podia parecer até irresponsabilidade largar o filho na mão da menina mais maluquinha da rua, perigando cair, se machucar, mas ela sabia que eu era criança e quem cai, levanta. A infância é um período muito curto em nossas vida, período de passar por todas essas experiências, vivenciando o mundo de forma lúdica porque quando crescemos os paralelepípedos são outros, as quedas são maiores e o que nos machuca não sangra e nem cura com mertiolate.
Um comentário:
Suas lembranças santoamarenses estão cada vez mais com cara de livro... quem sabe no futuro...
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