quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Uns dias para se lembrar (da minissérie Salgados Amigos)

Aquele era um dia para se esquecer. Todos os astros combinaram a fim de intenficar o meu inferno astral. Me sentia um alvo cheio de setas do abandono, do desprezo, da insensibilidade, do egoísmo, indiferença, acertando em cheio o centro de mim. Doía de doer, não era invenção. Chegou uma doutora que me empurrou goela a baixo um sub-lingual e me mandou trabalhar.

A chefona das borboletas até agora não havia chegado da noitada anterior. Ela que veio para me fazer companhia me deixou como Cleópatra em meio as almofadas, sem ninguém para abanar. A narradora e o pequeno gigante dormiram comigo com seus olhares de amor. Se há uma certeza nessa vida é que nunca eu fico só. Voltei do trabalho já mais animado, acho que o sub-lingual fez efeito, na verdade foram as companhias.

Saí para ver o sol com a chefona que já estava animadissima em contraste com meu desânimo. Do sol fomos cair no samba. Aí não tinha mais como fugir. Sentado no balcão do bar bebíamos os restos de roskas que o barman depositava em nosso copo.

Passou então o gatinho com aquele sorriso e o carinho mais carinhoso que eu podia receber naquele momento. Era para dar apenas um "oi pessoal", mas não arredou mais o pé de nossa companhia. Saimos felizes, querendo mais. Fomos para o anexo da casa e a chefona começou ali a sua derrota. O rapaz do lenço descartável, que nos acompanhava , nos deixou e foi descansar a matéria. A chefona humilhada por taxistas e garçons, acabou rolando na delicatessen:

- Oh fia, isso não é cachaça não, é tristeza!!! Dizia gargalhando no chão para a balconista, enquanto pegava a exagerada quantidade de bebida que consumiríamos dali a poucos minutos.

Enchemos a cara em casa, tomando ACTIVIA E RED LABEL pros problemas, ouvindo Cazuza, Maria Rita, Los Hermanos, Bethânia, Adriana Calcanhoto, Alcione, cortando os pulsos, abraçados eu, ela e o gatinho, certos de que somos pessoas da porra. As vezes metemos a cabeça e rodamos cinco vezes, mas quando tiramos, o que é cinza vira colorido, como essa tatuagem que dormi agora acarinhando e transformou os meus dias.

Esse foi mais um dia para se lembrar eternamente.

Trilha sonora deste capítulo
Você Perdeu
(composição de Márcio Valverde e Nélio Rosa, interpretada por Maria Bethânia)

Foi você quem se perdeu de mim

Foi você quem se perdeu
Foi você quem perdeu
Você perdeu

2 comentários:

Lucia Alfaya disse...

Somos mesmo pessoas da porra. Sobreviventes. Vencedores de uma guerra insana, a guerra da vida, que não pode ser vencida, pois sempre haverá o fim... Ainda assim, acreditamos e seguimos em frente, aos trancos e barrancos, impulsionados por uma fome insaciável, uma vontade maior que tudo. E vamo que vamo!
Bjs
Lúcia (uma admiradora).

Anônimo disse...

Uau. Que texto! Ou seria... que vida!

Abs