segunda-feira, 11 de maio de 2009

Não e não e mais um não

A alegria de Daniel era contagiante. Aquele menino, nem tão menino, pequeno, costas tortas, pernas finas, andava sobre rodas e voava. Pessoa de riso fácil, fazia-me sorrir com mais facilidade ainda, mas há um tempo percebo o olhar de meu amigo diferente, seu sorriso não muito largo, suas graças escassas. Recentemente ele me perguntou:

- O que fazemos quando não há um lugar que nos aceita?

Esta pergunta de Daniel mexeu comigo de tal forma que saí do seu lado e chorei. Não consegui responder a esta questão.

O que podemos fazer se não há um lugar que nos aceita? Viver é estar em algum lugar, não é? O estar em nenhum lugar, seria o que?

Ele me disse que não era o que eu estava pensando, mas que ele queria conseguir "não estar".

Não consegui escrever este post como desejei, não houve poesia que me chegasse. Não estava com coragem de escrever na primeira pessoa e inventei Daniel. Daniel sou eu. Hoje, mais uma vez, Salvador (a terra da alegria e beleza) me rejeitou como vem fazendo há mais de um ano. Hoje eu chorei de vergonha, de pena de mim, de raiva. Hoje eu queria matar. Hoje eu queria morrer. Não consegui sair de casa para trabalhar porque não houve um taxista (da Elitte Táxi e da Chame Táxi) que quisesse pegar cadeira de rodas. Como se eles tivessem este direito, como se seus carros não fossem serviços públicos, como se eu não fosse pagar a corrida. Todo dia é a mesma coisa, mas hoje eu sofri. acho que acumulou. Rejeição dói e a única coisa que eu escuto das empresas de táxi é: estamos tentando encontrar alguém que queira pegar cadeira de rodas, senhor! Minha mãe teve que sair de casa para ver se encontrava algum na rua que tivesse a "boa vontade" de me levar ao ensaio.

Não sei nem o que escrevo, mas queria pedir a quem ler isso aqui que dê sugestões do que devo fazer, o que devo pensar, sei lá.... lembrando que não tenho a quem reclamar e não há orgão que fiscalize isso.

Só existe o não e não e mais um não para não estranhar. Desculpe, senhor!

9 comentários:

Senhorita B. disse...

Você é talentoso, corajoso e muito além dessa falta de educação e cidadania destes "outros". Se eu estivesse em Salvador, ia buscar vc. Não vejo problema algum em pegar uma cadeira de rodas. Me surpreendo em saber que existem coisas deste tipo.
Talvez o ideal seja vc procurar um taxista que já tenha prestado serviços para algum amigo seu que tenha limitações. Se eu souber de alguém, aviso. Outra opção é procurar o MP estadual e denunciar tal abuso. Não é lícito o fato de uma empresa se recusar a prestar um serviço para alguém portador de limitações. Vou ver o fundamento jurídico no CDC e aviso.
Bjs

Senhorita B. disse...

Transporte de deficiente. Adaptação de veículo. Obrigatoriedade do Estado e Municípios. Artigos 226, parágrafos 1 ° e 2°, 244, 23, II, 24, XIV da CF/88. II. Artigo 277 da CE/89. Lei n° 7853/89 e Decreto n° 3298/99.
por Luiz Fernando Gama Pellegrini

O tema em tela sem dúvida é dos mais apaixonantes, e nas mesmas proporções dos mais delicados em face não apenas do contexto legislativo da matéria, cuja relevância sobrepuja qualquer outra indagação seja a que título for, mesmo porque amparar o deficiente físico é no mínimo um ato de dignidade e respeito ao ser humano.

Como terceiro mundo que ainda somos não ignoramos a enorme gravidade que o tema envolve, muito embora não se possa ignorar que o legislador constituinte legislou a contento sobre o tema, mas como veremos ainda a sua aplicação se dá com dificuldades.

A CF/88 por seus artigos 23, II, 24, XIV 227 e seu parágrafo 2°, 244 e 277 da CE/89 disciplinam de que maneira o Estado atenderá o deficiente físico, assim dispondo:

CONSTITUIÇÃO FEDERAL

Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:

...

II - cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência;

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

§ 2º - A lei disporá sobre normas de construção dos logradouros e dos edifícios de uso público e de fabricação de veículos de transporte coletivo, a fim de garantir acesso adequado às pessoas portadoras de deficiência. (grifamos)

Art. 244. A lei disporá sobre a adaptação dos logradouros, dos edifícios de uso público e dos veículos de transporte coletivo atualmente existentes a fim de garantir acesso adequado às pessoas portadoras de deficiência, conforme o disposto no art. 227, § 2º.

IVES GANDRA MARTINS E CELSO RIBEIRO BASTOS em seus comentários consignaram:

“(...)

O art. 244 vai adiante e exige que nova lei seja veiculada para permitir tal adaptação de logradouros, edifícios de uso público e transportes coletivos para que o deficiente físico tenha acesso a eles.

Dessa forma, o art. 227, § 2º, cuida da lei que disciplinará a construção dos futuros prédios, logradouros e veículos, enquanto o art. 244 impõe a adaptação daqueles já existentes, para que possam beneficiar-se os insuficientes, de imediato, da disposição constitucional.

A expressão “acesso adequado” é relevante, mas à evidência, como a gama das deficiências é quase infinita, não poderá haver critérios que beneficiem a todos, mas apenas aqueles que têm dificuldades de locomoção. Será, portanto, o mais adequado possível para a maioria dos deficientes, mas não para todos. Dificilmente um tetraplégico poderá ter adaptações possíveis ao seu nível de dependência.

É louvável a preocupação do constituinte com aqueles biologicamente menos afortunados, devendo-se lembrar que a deficiência de locomoção pode conviver com a genialidade, como ocorre com Stephen Hawking, um dos célebres astrônomos e físicos da atualidade.

A lei será federal, mas também Estados e Municípios poderão cuidar da matéria, os Estados e Municípios poderão cuidar da matéria, os Estados regulamentando as diretrizes gerais e os Municípios as complementares, visto que a competência legislativa é comum (art. 23, II).

É de se lembrar, por fim, que o constituinte ainda cuidou dos deficientes físicos no art. 37, VIII, ao eliminar a discriminação para cargos públicos, no art. 203, V, garantindo-lhes um salário mínimo, e no art. 24, XIV, que cuida da integração social e proteção do deficiente ao tratar da competência concorrente da União e Estados”.

(Comentários à Constituição do Brasil, 9º volume, ed. Saraiva, 1998, p. 155/156)

Andréia M. G. disse...

Oi, Edu!

Vi um comentário seu no blog de Renata e não pude ficar indiferente à situação, então, entrei aqui e pude entender melhor o que tinha ocorrido. Eu trabalho no MP e estranhei vc dizer que o MP foi o primeiro a dizer que não tinha o que ser feito, pois lá há um grupo voltado para essas questões que se chama Grupo de Atuação Especial em Defesa dos Direitos das Pessoas Portadoras de Deficiência – GEDEF. Sugiro que vc procure o GEDEF, pois a promotora de justiça que coordena esse grupo é extremamente atuante e provavelmente lhe dará um apoio. O nome dela é Silvana Almeida. Os telefones para contato são: 3103-6410 / 3103-6435. Espero que ajude. O que ocorreu com vc é realmente lamentável.

Força!

Unknown disse...

Escrevo antes de ler os comentários acima.
Primeiro: quero (sei que é difícil) que você continue com seu humor e sua risada mandando à porra essa cambada de feladaputa.
Segundo: Nesta porra de cidade quem "vende" as autorizações de táxi é a prefeitura? E se é a prefeitura não tem como se exigir uma fiscalização? Um telefonema para que a prefeitura não apenas multe e na sequência tome de volta a licença?
Ilusões minhas, troca de SET para salvador-não-se-que-lá e só piora...

Marcus Gusmão disse...

É a distância entre a lei e a realidade. O que dói mais é a estupidez humana. Vivi uma situação infinitamente menos complicada mas o sentimento era de indignação foi semelhante, fiquei puto, muito puto da vida. Morava na Garibaldi, minha filha com três dias de nascida precisou fazer um exame de sangue. Chamei a empresa de sempre (fazia corridas quase diárias) mas recebi pelos peitos a cara feia e o bater de portas do taxista porque a corrida era pra perto, curta mesmo. Mas eu não podia ir nem a pé nem de ônibus com a criança. E o pior Edu, é que não houve recusa da parte do cara. Apenas cara feia, resmungo e porta batida. E eu ali puto da vida, muito puto mesmo, com vontade de picar a mão no cara. Digo tudo isso só pra lembrar que a questão não é apenas legal, embora comece por ela. Esse mundo tem muito o que mudar cara, força, sorriso na cara e boca no trombone. Vamo que vamo. Grande abraço.

Muadiê Maria disse...

Edu, não li os comentários acima, que sei que são de responsa.
A minha sugestão é que vc tenha um ou dois motoristas de taxi "acertados" previamente para levar e trazer vc ao trabalho, dessa maneira vc não fica a mercê da boa vontade.
Nós, mulheres, costumeiras vítimas de violência sexual, fazemos isso quando precisamos voltar de madrugada, por exemplo, de algum lugar.
Um beijo,
Martha

Andréia M. G. disse...

Edu, obrigada pela visita tb. Tente falar diretamente com a promotora Silvana para lhe dar uma orientação sobre o caso. :-)

Shirley Stolze disse...

Edu,eu tenho um taxista conhecido que não é um grande profissional.O nome dele é Joel e o tel.9936-9029,pode falar com ele.Gosto de voce com esse riso enorme no rosto.Bola pra frente.Bjssss

imonizpacheco disse...

A capacidade de indignação é ponto crucial na construção da cidadania. É impressionante como diariamente nos vemos frente a casos como esse.
Não sei o que dizer. Vou me acalmar e volto a lhe falar.
Bj, oto, tchau